Eu acordei no meio da madrugada, num solavanco. Estavam todos dormindo, menos o Phe, eu acho. Estava nebuloso e o céu cinzento denunciava um dia triste e possivelmente chuvoso. Eu estava novamente deitada sobre as mochilas, o meu ombro doía, mas não insuportavelmente. Meus amigos dormiam e não havia mais nada que eu pudesse fazer se não observar a paisagem. Não estava certo. Não estava nada certo. A gente estava á uns trinta metros do túnel, depois dele qualquer caminho que a gente tomasse levaria para uma paisagem de prédios e comércio, civilização ou coisas assim. mas estávamos na praia, não na rua da praia e sim na areia. Apenas a uns quarenta centímetros do mar, escuro e de águas gélidas. Claro que eu me desesperei, refiz mentalmente o caminho que poderia nos levar até lá. Só havia dois, eu precisava reconhecer a praia para ter certeza. Era como todas as outras, areia clara e mar escuro. Eu tentei olhar além, alguma ilha ou paisagem ao longe. Não era possível.Não. Não podia ser. Três ilhas ao fundo, perfeitamente alinhadas como se fossem uma só. Estávamos na praia da Enseada. Como o Phe poderia saber o caminho? Duas a direita, uma a esquerda, reto e depois á direita no caminho a pé. Era o único que eu conhecia e não havia dito a ninguém. Como ele poderia saber? Um vento gelado me atingiu, eu virei o rosto rapidamente e meus cabelos balançaram me acompanhando. Um rosto se ergueu no retrovisor, eu pude ver pela janelinha meio embaçada. O carro parou e uma porta se abriu. Estava realmente frio, e ontem havia sido um dia típico de verão. Interessante como o tempo pode mudar drásticamente. Eu ouvi passos abafados na areia, talvez o Phe quisesse esticar as pernas um pouco. Mas ele alcançou minha vista, o menino estranho. Ele estava dirigindo o carro. Era esquisito, primeiro a ligação direta e depois dirigindo um carro enquanto todos dormiam. Tudo bem que eu também dirigi, mas isso era totalmente diferente. O menino andou até mim, o rosto encoberto nas sombras do capuz, eu estava começando achar tudo aquilo ridículo, porquê ele não mostrava logo o rosto? Ele chegou bem perto de mim, eu estava sentada agora- Consegui com um pouco de esforço me endireitar- O menino estendeu a mão para mim, um convite. Eu não entendia porquê ele ficava mudo, de qualquer jeito consegui saltar da caminhonete, eu caminhei até a água, não me importei de molhar o meu all-star favorito. Era um péssimo dia para estar de camiseta sem mangas, mesmo que essa camiseta fosse a sua preferida. Eu parei de andar e fui olhar o mar, parecia deprimente agora. Não só o mar como toda a praia, deserta e fria. Como um pesadelo. O menino ficou ao meu lado, mudo como sempre.
-Porquê você não desiste de bancar o cara mudo e distante e me conta o que está acontecendo?
Toda aquela histórinha estava de deixando irritada.
-Um apocalipse zumbi está acontecendo, isso não é o bastante?
Eu não esperava resposta, sua voz me surpreendeu. Não que eu pudesse descrevê-la ou coisa assim.
-Não, na verdade um acontecimento assim não daria de resultado um cara que anda o tempo todo com um capuz e não fala absolutamente nada, bom até agora.
Ele sorriu e tirou o capuz. Ele era incrivelmente bonito, tá agora parecia que eu estava afim dele sem ao menos o conhecer.
-Meu nome é Lucas.
Ele me estendeu a mão.
-Meu nome é Bia, quero dizer, Nathalia. É Nathalia.
Ele riu.
-Como assim?
-Bom, é uma longa história.
-Acho que temos tempo até eles acordarem.
Eu me afastei da água e me sentei na areia, Lucas me acompanhou.
-Pode começar.
Eu sorri.
-Tudo bem, ahm eu sabia que meus pais nunca ultrapassariam a barricada que os militares fizeram, nem sei como vocês passaram mas emfim, seria bom esquecer de tudo o que eu fiz antes disso tudo começar.
-Como o quê?
-Eu fui fichada dois meses atrás, por porte de bebida e por acompanhar uns babacas.
Ele ficou confuso.
-Tinha um cara que eu estava gostando, mesmo sabendo que não daria certo porque ele tinha dezoito anos e tudo mais, mas mesmo assim eu saí com ele e uns amigos idiotas. No fim,eu estava distraída demais para notar o que eles fizeram, distraída demais até que eu ouvi as sirenes e eles começaram a correr. O garoto que eu gostava estava pulando o muro, eu tentei fazer isso também mas ele soltou minha mão e correu antes que eu pudesse fazer alguma coisa. Os policiais me levaram para a delegacia e eu fui fichada porquê eles estavam apostando corrida e bebendo. Eu nem estava fazendo nenhuma das duas coisas, mas como eu não fiz nada eles me colocaram como cúmplice. Fiquei quatro meses de castigo.
-Você ainda gosta dele?
-Isso não vem ao caso.
-Me fala.
-Eu...Eu não sei, mas porquê você quer saber?
Ele ficou em silêncio alguns minutos e depois falou.
-É que... Eu poderia ter agora alguém que eu gosto, se eu não fosse tão covarde.
-Quer me contar?
-Foi no dia em que isso começou, talvez na noite anterior. Eu estava com uns amigos numa festa e eles queriam dar uma volta, eu tenho que admitir meus amigos não eram boa companhia, mas eu saia com eles em parte para irritar meus pais e em parte porquê uma menina que eu achava estar gostando também andava com eles, foi assim que eu aprendi a dirigir e a fazer ligação direta- Ele sorriu - Mas eu me distraí por um segundo, eles estavam no carro comigo a garota no banco do passageiro e eu estava dirigindo, eu pensei ter visto alguma coisa e virei a cabeça por um segundo. Eu bati na árvore e ela ficou bem ferida, e se eu não tivesse tido tanto medo de ser pego dirigindo que saí correndo e deixei ela lá, o noticiário disse que ela morreu no caminho pro hospital e os dois meninos estavam desacordados na UTI. Com medo denovo eu fugi de casa, acho que meus pais nem perceberam, mas de manhã eu estava metido nesse apocalipse, o único modo foi aceitar e me esconder debaixo do capuz.
O sol estava nascendo, não querendo ignorar a história dele, mas eu estava realizando algo da minha lista-quase-secreta-de-desejos. Quase secreta porquê as meninas sabiam, de qualquer modo eu estava vendo o nascer do sol na praia. Logo eles acordariam e nossa jornada estaria um passo mais perto do verdadeiro início.
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